Extraído de: ROGERS, C.R. Tornar-se Pessoa (Cap.: – “Ser o que realmente se é: os objetivos pessoais vistos por um terapeuta”). São Paulo: Martins Fontes, 5ª ed. 1997
“Para alguns ser o que se é, é permanecer estático. (…) Nada pode estar mais longe da verdade. Ser o que se é, é mergulhar inteiramente num processo. A mudança encontra-se facilitada, e provavelmente levada ao extremo, quando se assume ser o que verdadeiramente se é.” (ROGERS, 1977; 155).
Observação Positiva:
"Vida Plena" é um processo, não um estado de ser. É uma direção, não um destino.
A "Vida Plena" é o processo do movimento numa direção que o organismo humano
seleciona quando é interiormente livre para se mover em qualquer direção, e as
características dessa direção escolhida revelam uma certa universalidade.
Observação Negativa:
"Vida Plena" não é um estado fixo. Não é um estado de virtude, de contentamento, de
nirvana ou de felicidade. Não é uma condição em que o indivíduo esteja adaptado, cumulado
ou atualizado. Não é um estado de redução de impulsos, de redução de tensão ou de
homeostase.
Características do Processo
1. Uma Abertura Crescente à Experiência
Esta atitude é oposta à atitude defensiva. A pessoa torna-se progressivamente mais capaz de
ouvir a si mesma, de experimentar o que se passa em si. Está mais aberta aos seus
sentimentos de receio, de desânimo e de desgosto. Fica igualmente mais aberta aos seus
sentimentos de coragem, de ternura e de fervor. É livre para viver os seus sentimentos
subjetivamente, como eles em si existem, e é igualmente livre para tomar consciência deles.
Torna-se mais capaz de viver completamente a experiência do seu organismo, em vez de o
impedir de atingir a consciência.
2. Aumento da Vivência Existencial
Esta característica implica uma tendência para viver plenamente cada momento. Uma pessoa
que esteja plenamente aberta a cada experiência nova, completamente desprovida de uma
atitude de defesa, vive cada momento da sua vida como novo. A configuração de
estímulos internos e externos que existe num determinado momento nunca antes existira
exatamente da mesma maneira. Por conseguinte, essa pessoa compreenderia que “aquilo que
eu vou ser no próximo momento e aquilo que eu vou fazer nasce desse momento e não pode
ser previsto de antemão nem por mim nem pelos outros”.
Uma forma de exprimir a fluidez que está presente numa tal vivência existencial é dizer que
o eu e a personalidade emergem da experiência, em vez de dizer que a experiência foi
traduzida ou deformada para se ajustar a uma estrutura preconcebida do eu. Isto quer dizer
que uma pessoa se torna um participante e um observador do processo em curso da
experiência organísmica, em vez de controlá-lo.
Esse viver no momento significa uma ausência de rigidez, de organização estreita, de
imposição de uma estrutura à experiência. Significa muito especialmente um máximo de
adaptabilidade, uma descoberta de estrutura na experiência, uma organização fluente,
mutável, do eu e da personalidade. A maior parte de nós, porém, aplica à experiência uma
estrutura pré-fabricada, uma apreciação, e nunca a abandona, comprimindo e deformando a
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experiência para adaptá-la às nossas idéias preconcebidas, irritados com os aspectos fugidios
que a tornam tão difícil de adaptar às nossas esquadrias cuidadosamente construídas. Abrir o
espírito àquilo que se está a passar agora, e descobrir no processo presente a estrutura
específica que se apresenta, tal é, uma das características da "Vida Plena".
3. Uma Confiança Crescente No Seu Organismo
A pessoa torna-se mais capaz de confiar nas suas reações organísmicas totais frente a uma
nova situação porque foi progressivamente descobrindo que, se estivesse aberta à sua
experiência, se fizesse o que sente que seria bom fazer, essas reações revelar-se-iam como
um guia completo e digno de confiança do comportamento que realmente satisfaz. Os
defeitos que invalidam a confiança no processo em muitos de nós são a inclusão de
informações que não pertencem à situação presente, ou a exclusão de informação que lhe diz
respeito. É quando a memória e a aprendizagem anterior se introduzem nos cálculos, como
se fossem essa realidade e não memória e aprendizagem, que é fornecido como resposta um
comportamento errado.
4. O Processo De Um Funcionamento Mais Pleno
A pessoa torna-se mais capaz de experimentar todos os seus sentimentos e, por isso, passa
a ter menos medo deles; filtra a sua própria experiência e mostra-se mais aberto aos
testemunhos que provêm de outras fontes; mergulha completamente no processo de ser e de
se tornar o que é, descobrindo então que é profunda e radicalmente social; vive de um
modo mais pleno no momento que passa, pois aprende que é sempre essa a maneira mais
saudável de viver. A pessoa torna-se um organismo que funciona mais plenamente e, devido
à consciência de si mesmo que corre livremente na e através da sua experiência, torna-se
uma pessoa que funciona de um modo pleno.
Conclusão
Assim, adjetivos tais como feliz, satisfeito, contente, agradável, não parecem adequados para
uma descrição geral do processo de “Vida Plena”, mesmo que a pessoa envolvida neste
processo experimente cada um destes sentimentos nos devidos momentos. Mas os adjetivos
que parecem de um modo geral mais apropriados são: enriquecedor, apaixonante, valioso,
estimulante, significativo. O processo da “Vida Plena” não é um gênero de vida que
convenha aos que desanimam facilmente. Este processo implica a expansão e a maturação de
todas as potencialidades de uma pessoa. Implica a coragem de ser. Significa que se
mergulha em cheio na corrente da vida. E, no entanto, o que há de mais profundamente
apaixonante em relação aos seres humanos é que, quando a pessoa se torna livre
interiormente, escolhe esta “Vida Plena” como processo de transformação.
Fonte: Grupo Ser BH, Artigo 18
Leia o livro Tornar-se Pessoa, de Rogers, na íntegra clicando aqui.